Literária sempre. Monótona, jamais.

Devaneios de um protótipo humano na infoesfera.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

À Noite



Por: Viviane Cabrera




O sol se vai
e a noite cai.
Cobre o dia de noite e sai
em busca do que mais atrai.

Vejo o céu e a lua que se esconde
os olhos se perdem sem que algo lhes assombre.
No ar, a esperança de que coisas sonde.
E o coração indaga: ONDE? ONDE?

No silêncio estrelado do breu
a expectativa de revitalizar o que adoeceu,
vai ao encontro de algo seu.
Fusão de duas vidas. Desejo meu.

E a lua esplendorosa e cheia
flutua no céu e nele vagueia.
Revela beleza que incendeia
uma alma que de desilusão às vezes falseia.


Tomando um céu inteiro
a lua plena vem com seu jeito faceiro
dar sua permissão para que o beijoqueiro
toque o mel de meus lábios desejosos de um jeito matreiro.

E quando o sol ao seu posto ameça retornar,
a noite se despede com a promessa de que há de voltar.
Há de trazer de à tona o sonho que guardado vai ficar
para no momento certo maravilhas fazer eclodir, revelar.

Vão-se embora as estrelas brilhantes.
Agora se apagam. Mas logo encantam como dantes
com suas luzes fortes e elegantes
que suscitam sensações mais que relevantes.

Que o dia lave a escuridão
e leve embora o que de resquício ainda oprime o coração.
Que reserve à noite sua volúpia e amplidão,
tornando nulo qualquer vestígio de sofreguidão.




domingo, 17 de fevereiro de 2013

Palavrear



Por: Viviane Cabrera





Jamais tome a palavra em vão.
Ela é ouro, prata. Nunca latão.
Substância máxima de comunicação.
Sem ela somos nada. Somos completa anulação.

Não subestime seu valor.
Ela seduz. Ela é a morte e o amor.
É sublime e rude simultaneamente com ardor.
Tem o poder tanto de união quanto desagregador.

Laçá-la já não se pode,
pois é livre na existência em que eclode.
Deixar fluir palavras é ode
que aos deuses em seus ouvidos o louvor prazerosamente explode.

Palavrear
nada mais é que uma arte milenar
onde se aprende a tumultuar ou acalmar.
É um jeito doce e inconsciente de se expor e amar.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Saia Ao Vento


Por: Viviane Cabrera







Num dia barulhento
a saia em meio ao vento
ondula livre, flutuando no nada,
querendo revelar o que por baixo dela  se guarda.

Vagueia,
como um rabo de sereia
no movimento que reproduz
enquanto olhos alheios observam seu farfalhar, coisa que seduz.

Num rompante,
sobe a saia com um vento matreiro e deselegante,
fazendo a moça ficar enrubescida 
por aquela cena constrangedora que por muitos fora assistida.

Logo volta a colar no corpo,
alisada pela tímida moça que retoma o habitual conforto.
É a saia um pedaço de pano que não se contenta
em ser somente vestimenta.

Ao fim do dia,
despe-se a mulher com displicência e afasia,
jogando a saia no cesto do que deve ser lavado.
Talvez a saia só queira mesmo é no vento mostrar o seu bailado.

Talvez sejamos nós
saias buscando livrar-se da vida atroz.
Talvez queiramos apenas a liberdade
de flutuar na vida e nela mover-se com autenticidade.








domingo, 10 de fevereiro de 2013

Pulso Pulsar


Por: Viviane Cabrera




Pergunto por ti e o coração responde em vão. 
Insensato coração!
Não sabe que poucos dão valor 
à preciosidade rara do amor?
Acorda, Alice!
Quem foi que disse
que amar traz felicidade?
Traz é a lacuna da saudade,
doendo
batendo
martelando forte no peito,
tirando a gente do eixo de jeito.
E assim vamos vivendo nessa dura realidade.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Amor de Carnaval

Por: Viviane Cabrera







Carnaval. Lá foi ele para um desses clubes pular à moda antiga com confete e serpentina. Não era à toa sua predileção por essa festividade. Talvez fosse um dos únicos momentos em que podia se dar ao luxo de rir a exaustão, se divertir, mesmo com o relógio ainda a trabalhar como o de costume, marcando compasso. Naqueles poucos dias, permitia-se viver fora da rigidez da rotina que o agrilhoava.

Beber com os amigos jogando conversa fora e sem franzir o cenho com preocupações escondidas em cantos dos pensamentos. Ali era livre. Saltava de pescoço em pescoço feminino que encontrava pelo caminho e não deixava promessas de ligações posteriores. Ficava apenas a lembrança de seus galanteios, cheirando a cigarro barato e cerveja vagabunda.

Anos e anos as mesmas velhas coisas, na mesma época, mesmos lugares, os mesmos amigos, as mesmas cantadinhas toscas mas que lhe rendiam noites prazerosas. Cansou. Nesse dia especificamente, pensou em ficar quieto, observar a folia. 

Hora marcada, lá estava ele. Começou a beber com os amigos e a discutir sobre as falhas no esquema tático da seleção brasileira, assunto de horas. E enquanto todos entretinham-se no debate acalorado, correu o olhar pelo salão. Não existia mundo lá fora. O microcosmo em que estava agora era de uma atmosfera de alegrias regada a uma artificialidade sem fim. 

Risos frouxos ecoavam de maneira macabra e o que antes fazia bem, agora estremecia seu corpo em constantes calafrios. Tudo muito diferente. O rapaz já pensava em se retirar do clube, pois aquelas novidades que talvez sempre estivessem bem debaixo de seu nariz e ele não percebera o incomodavam enormemente. Contudo, seus olhos ficaram magnetizados em um ponto fixo.

Estática, com uma taça de martini na mão direita, estava uma moça. Olhar rutilante, cabisbaixa, fazia ela movimentos circulares com o drink como se isso pudesse misturar a realidade que a atormentava ainda ali, naquele faz de conta, e ver no que ia dar.

Intrigava aquela figura altiva e atraente parada, esperando um sei lá o quê do acaso. Tentou imaginar as diversas hipóteses do que poderia passar naquela alma solitária e esse encontro que ele tinha naquele instante com o desconhecido, o obscuro, o excitava.

Aproximou-se com um martini na mão, que ofereceu a ela, e sentou displicentemente ao seu lado. A mulher era de uma substância que ele não estava acostumado. Era diferente e isso despertava nele uma ansiedade. Depois de meia hora de investidas frustradas, agradeceu a companhia, disse adeus e foi em direção à saída. Queria sair daquele inferno. 

De repente, sentiu que seguravam seu braço. Era ela. 

- Me leva pra longe daqui. Não importa o lugar. 

Foram para um bistrô ali próximo, onde era mais calmo e conseguiriam conversar.

- Por que mudou de ideia? - o homem se contorcia de curiosidade.

- Vi que você é diferente.

- Diferente? Eu? - e riu-se, deixando a cabeça pender para trás - Explica isso que quero entender.

Observou que enquanto esboçava de falar, a moça cutucava nervosamente a cutícula das unhas.

- Você poderia ter escolhido chegar nas outras que estavam mais fáceis, soltas, rodopiando no salão. Veio até mim. Por quê?

Agora era ele que estava nervoso. "Por que eu a quis? Nem eu sei", pensou.

- Acho que ainda estou em vias de descobrir isso. Não sei.

Viu que ela decepcionou-se com a resposta. Não eram as palavras esperadas

- Você tem uma aura misteriosa que atrai. Esse jeito seu, por Deus, fiquei magnetizado! Eu te quero... - descarregou esse tiroteio de sentenças que a fez levantar a cabeça e corar. 

Aquele ser angelical posto diante de si o despertava mesmo isso. Era algo muito súbito, mas tão bonito quanto qualquer outra relíquia do tempo. Quis então desfazer-se em verdades.

- Olha. É a primeira vez que nos vemos e nada sabemos um do outro. Só que... É até estranho dizer uma coisa dessas... Eu quero descobrir o quê e quem é você, dia após dia, por toda a minha vida. Não sou nenhum tarado, psicopata, malfeitor. Apenas sinto que te quero para mim. Hoje e sempre. 

Ela que ouvia atentamente, desatou a chorar. Saíram dali. Foram para um hotel onde ficaram juntos. Quando estavam abraçados, a mulher agradeceu e revelou ser esta a maior demonstração de amor que já recebera, ainda que vinda de um estranho. Ele que estava todo tomado de amor, abraçou-a forte e assim dormiram.

Num rompante, o sujeito acorda pela manhã. A cabeça que dava mais giros que chapéu mexicano sinalizava uma ressaca daquelas. Olhou para o lado, pois queria abraçá-la, beijá-la. Estava sozinho. Levantou-se, correu ao banheiro. Nada dela ali. Ligou na recepção para saber se tinham visto alguém com as características de seu anjo indo embora e soube que ela se fora assim que o sol nasceu, apressada.

Doido de raiva, dava murros nas paredes, na cama. Chorava feito menino. Não se conformava com o fato de ter rasgado o peito, entregue seu coração sem receio. Descortinou-se para ela. Mas não bastou, ao que parece.

Achou um pequeno bilhete colocado no bolso de sua calça em que constava a breve justificativa.

"Tenho medo. Desculpe".

Sem nome, assinatura ou longas explanações. Somente duas malditas frases que inviabilizavam sua felicidade. Para o homem, ver-se apaixonado e entregar-se em vão era uma estupidez da qual jamais se perdoaria. Ligou o rádio e deitou na cama. Ouvia uma marchinha de carnaval e fumava, dando baforadas que emanavam as lembranças do dia anterior.

 VOCÊ
PARTIU DE MADRUGADA
E NÃO ME DISSE NADA.
ISSO NÃO SE FAZ!
ME DEIXOU CHEIO DE SAUDADE
E PAIXÃO.
NÃO ME CONFORMO
COM A SUA INGRATIDÃO.
(CHOREI PORQUE)

AGORA DESFEITO O NOSSO AMOR,
EU VOU CHORAR DE DOR.
NÃO POSSO ESQUECER.
VOU VIVER DISTANTE DOS TEUS OLHOS.
OH! QUERIDA!
NÃO ME DEU
UM ADEUS, POR DESPEDIDA! 

Voltou para casa. Só na quarta-feira de cinzas é que se deu conta. Tudo era perfeito demais para sobreviver na dureza do cotidiano. Pois então, que virasse fantasia de carnaval.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Tempo


Por: Viviane Cabrera





Em minhas mãos estão as horas,
escorrendo entre os dedos, gota a gota, vão-se embora
levando consigo um pouco do brilho que havia no olhar.
Deixando apenas uma vaga sensação de que tudo há de passar.

Escorre e corre 
numa velocidade tão sua onde recorre
ao metafísico momento
de esvaziar e purificar os mais diversos pensamentos.

Na queda até o chão,
o tempo que escoa da mão,
prova ao ser humano
a impossibilidade do querer insano
de controlar o que lhe é alheio,
para que este aprenda a lidar com seu anseio.

E nos pingos que finalizam o processo
de um círculo vicioso e regresso,
o relógio completa sua volta
onde a vida logo nos aperta e solta
divertindo-se às custas desses meros mortais
que querem somente ser feliz e nada mais.






sábado, 2 de fevereiro de 2013

Um Poema Para Yemanjá



Por: Viviane Cabrera





Odoiá, Yemanjá!
Mãe minha, musa da imensidão de lá e de cá.
De lá das vagas azuis que balançam a jangada.
De cá das tormentas que criam ondas homéricas nessa existência ousada.
Odoiá, Yemanjá!
Há muita sorte em ter como guia uma estrela
vestida de mar.
Ela que das lágrimas que derramo vai a transformar
em pérolas para brilhar de noite
para alegrar os olhos de quem ainda vive do açoite
dos sofrimentos que causa a vida.
Faz com que seja curada a ferida
só de nos mostrar sua beleza de Mãe d'água
em plena luz da lua.

Já te presenteei com meus negros cabelos
para agradecer teus constantes zelos
maternos e misericordiosos.
Mas hoje quero mais do que ofertar presentes cariciosos.
Quero derramar-me por inteira,
eu toda intensa nessa sua corrente de amor arrastadeira,
para colocar em palavras minha gratidão.
Esse sentimento forte que balança as cordas de meu coração.
Quero te dizer somente,
quero que fique ciente,
que com minha alma mergulho nas águas de tua instância
buscando perfeita assonância
para entregar
nas ondas do teu mar.

Salve, Janaína!
Envolve-me em tua água cristalina
 e vem receber as flores que te oferto.
São humildes, simples, mas vem de um coração aberto
e que é grato, 
por poder ter esse iluminado contato.
Tu que é enviada de Oxalá,
recebe também as velas
com pedidos para que me liberte das muitas celas
que ao longo da existência eu me trancafiei
sem saber e querer, onde me iludi e nas lamas do acaso boiei.
Desde já, te adorno com meu amor
e sei que a correnteza, um dia, há de levar toda a dor
à nulidade de não mais afetar meu ser.
Mergulho no teu mar sentindo o gosto do sal a me refazer.

Abandono meu corpo às ondas que o acariciam
 e com leves movimentos pretendo chegar onde as coisas se iniciam.
Ainda estarei contigo lá no fundo,
coisa melhor não deve haver no mundo
que estar cercada de tão doce companhia.
Vem, minha Mãe, preenche-me de teu mel e contagia a vida de alegria.
 Faz dela um palco sem fim.
Valerá a pena só se for assim.
Me despeço cá na certeza
do valor de sua realeza
e pela ciência de que para te encontrar
pode ser aqui dentro do coração ou na imensidão azul do mar.
Por isso é meu orixá.
Mãe linda, sereia encantadora e querida Yemanjá.