Literária sempre. Monótona, jamais.

Devaneios de um protótipo humano na infoesfera.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

De Escrever

Por: Viviane Cabrera







Ultimamente estou voltada aos fatídicos e derradeiros desenganos do acaso. Cansei dessa veia romântica ao estilo dos Irmãos Grimm que aprisiona e engessa toda a ideia de naturalidade. O fluxo das coisas precisam e merecem ser respeitadas, pois a vida é bem isso: um desaguar de situações desconexas que se acorrentam umas às outras até tecerem uma malha férrea de acontecimentos. Importa é o gosto das palavras soltas, libertas para que tenham espaço para significar o que quiserem. Sou moleca que tem mania de palavrear tudo que sente, observa e percebe. Escrever, para mim, é uma brincadeira séria. 

Pouco importa se o final é feliz ou triste. O enredo que se conta é que precisa pegar o leitor pelo pé, pelas entranhas, pela alma, pelo coração. O relevante é que o rumo das coisas caminhem para o melhor dos personagens. Seu encerramento acaba sendo mero detalhe. É um mundo a parte que adentramos para explorar. Sem ambição alguma. Somente pelo simples prazer das descobertas e novas sensações que proporciona. É onde o jeito que me codifico em letras é minha identidade, meu rosto. É onde moldo o barro para que se transforme em cerâmica. 


E o bom da escrita é justamente isso. Somos submetidos voluntariamente a ser reféns de nossas palavras, personagem de nossos personagens. Devemos deixar que o processo todo abuse de boa vontade que temos. É forma de se libertar. Deles e do que mais estiver preso por aí. Assim é que se dá minha redenção. Seja para falar do bem ou do mal. Essas drogas de demônios fazem é estrago dentro da gente, arranhando ao querer sair do jeito que for. Aí é que dar vazão a eles passa a ser um bálsamo. Pois a cada palavra, acalmam-se e me deixam em paz. Coloquei os tais demônios para pensarem por mim e fico apenas com o serviço de psicografar.


Que me desculpem os desavisados. Mas quando a inspiração me pega, não faço força alguma para escapar. Mergulho sem perder o ar, de olhos bem abertos e braços a espera do que possa vir a ser.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Uma Brisa, Uma Frase e Vários Sonhos

Por: Viviane Cabrera
 
 
 

Certa vez me disseram que só pode oferecer água quem tem um poço dela repleto. Por não achar água onde julguei que encontraria é que vou em busca de novos caminhos. Os olhos necessitam de horizontes diferentes, pois acostumaram-se demais ao cenário de então. 


Não se trata de apontar o dedo para o outro, mas de aceitar e respeitar meu jeito, não violentando-o. Cansei de muita coisa, inclusive de me excluir da lista de prioridades. Um dia a gente acorda, baby. E ainda bem que não é tarde demais.

Todos os dias, encaro de frente esse enigma da Esfinge da Vida. "Decifra-me ou devoro-te!", brada imperativamente ela. No entanto, são tantas as armadilhas e seus embustes que já não sei mais qual é a vantagem do que. Pois que me devore. Continuo como Sócrates, tendo a consciência de minha total ignorância.

Aí é que decidi calar. Não sei por quanto tempo essa necessidade intrínseca pelo silêncio há de durar. Até mesmo porque não sei ouvir quieta à descabidas palavras sem que me manifeste. Perdi a conta das vezes em que olhei no espelho e vi transfigurado meu olhar. Perturbou-me de tal forma saber que já não eram meus olhos, mas a maneira de olhar que se refazia numa espécie de metamorfose que resolvi calar para acompanhar com atenção os tic-tacs de um tempo que voava livre de qualquer obrigação.

Apenas calculo que será suficientemente preciso para retomar o fôlego e emergir das águas gélidas as quais tenho deixado meu corpo afundar. Como diria Fernando Pessoa, "Falta sempre uma coisa, um copo, uma brisa, uma frase. E a vida dói quando mais se goza e quanto mais se inventa". Quero compreender essa falta, essa dor. Quem sabe assim ela passa.

Vivemos numa existência solta, em um universo absorto no silêncio. Ainda que coberta por ele, procuro na escrita a válvula de escape. Escrever é um constante exercício para livrar-se de antigos demônios. Os meus precisam sair devagar para não congestionarem e atrapalhar todo o processo.

Já foi dito - e muito bem dito, por sinal - que os defeitos também são necessários para compor o aquilo que se chama "eu". Eis em mim complexidade de antíteses que se completam na incoerência que há em ser humana, demasiada humana. Sou ao cubo. Não vou na maré de opiniões alheias. O que me satisfaz é o que enternece alma e coração. Apego-me apenas a esse conceito e sigo em frente. Sempre. Cabeça erguida, ombros alinhados e os pensamentos correndo na mente.
 
Solidão é mesmo um momento ímpar. É quando podemos olhar para dentro e nos perder em infinitos detalhes e descobertas. Nessa perda que nos encontramos cada vez mais. Ando aprendendo a me ilhar, cercar-me da água do acaso e esperar o resgate da vida. Já não tenho forças para ir tão alto nem paciência para descer tanto. Sonhos eu carrego no coração e não me furto a entregar-me a eles. É a única chance que eles têm de serem concretizados e eu de ser feliz.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Do Acessório Ao Imprescindível

Por: Viviane Cabrera



 

Estou de luto. Mas não perdi parente, cachorro de raça, gato de estimação, papaguaio ou namorado. Perdi mesmo é meu brinco de ouro, lástima que não há barra de chocolate belga, sexo do bom e cantada de pedreiro no mundo que substitua. Dá um vazio existencial que dói no mais íntimo de mim.
 
O artefato de metal nobre era fruto de um mimo feito por alguém que já se foi. Transcende ao valor material. Usar aquele par de brincos era como que se eu estivesse perto ainda daquela pessoa que me era tão especial.
 
Agora, sinto falta de algo que não sei bem o que é. Não é só a falta do bendito brinco, mas das coisas que representava. Ia muito além de sua beleza. Fato é que eu ficava com o semblante tranquilo e feliz quando com ele estava.
 
A teimosia é tanta que me recuso a tirar o brinco que restou. Parece que é coisa de estilo. Contudo, não passa de não saber desapegar de um sentimento reconfortante que acompanhou-me por longa data. Cismei e ponto final.
 
Resumindo a ópera, essa lacuna punjante em meu coração irá doer toda vez em que tocar as orelhas e não mais notar o brinco em seu devido lugar. Perdi muito mais do que um acessório. Perdi parte de minha história feita de metal. Perdi parte de mim numa pesada fração de instantes que passaram  despercebidos. Só que jamais serão esquecidos.