Literária sempre. Monótona, jamais.

Devaneios de um protótipo humano na infoesfera.

domingo, 1 de abril de 2012

Uma Macabéa Real

Por Viviane Cabrera




Desconcertada. Olhar esquivado aos outros. Como um pedido de desculpas por estar ali. Cabeça torta pro chão, ensaiava lágrimas quase petrificadas por dentro e que jamais aflorariam. Não tinha tempo para isso.  A vida a carregava aos solavancos, sem chance de decidir. Tudo que fizera até então, fora involuntário. Contra a vontade.

Na lotação do trem, espremia-se cada vez mais para que coubessem mais pessoas naquele pequenino espaço apertado. A samaritana preferia punir-se com o contorcionismo a ocupar seu lugar de direito.

Por essa razão havia abdicado de muita coisa. Não se achava merecedora. Lembrava sempre de um tio que dizia que só quem sofre aqui terá o céu mais tarde. Por isso a penitência. Por isso a resignação.

O rosto sulcado pelo tempo parecia dizer algo além de sabedoria. Chegava na esfera de mártires. Suas mãos cansadas  evitavam qualquer esboço de movimentos por si, mas por outros até arriscaria. No entanto, quem essa alma salvaria, afinal?

Era essa a pergunta que me fazia diante de tal figura. Quase um "decifra-me ou devoro-te" que atormentava minha observação. Por um infortúnio, desci do trem antes dela. Voltei-me para, mais uma vez, sugar o que ela parecia querer passar. Em vão. 

Agora sentada, fechou os olhos cheios de cansaço e punha-se a sonhar. Foi então, que fiquei satisfeita. Não porque a deixava a mercê da própria sorte, mas sim pelo fato de que ela executava justamente a tarefa que julguei ser impossível. Aquela mulher  também se dava ao desfrute de sonhar.

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