Literária sempre. Monótona, jamais.

Devaneios de um protótipo humano na infoesfera.

sábado, 29 de setembro de 2012

Poesia

Por: Viviane Cabrera








Há dias em que as lágrimas escorrem.
Sofridas, a pele enrugada percorrem
o rosto marcado
por força da vida, cunhado.


O sangue quente,
de ânimo duro e renitente,
aguarda dias melhores,
enquanto a razão sabe que podem ser piores.


Mas logo as mãos interrompem o choro.
Vem um entusiasmo, canto de anjos internos em coro,
que erguem os olhos ao céu
e deixam tudo o que sufocava ao léu.


É nesse momento que a poesia se apossa de mim,
faz morada nas entranhas e ama-me sem fim.
Poesia é uma forma de colorir a vida.
Poesia é o remédio que cicatriza toda a ferida.


Arte que encanta, transforma-se em dança
em que rodopiam radiantes e risonhas em movimento que não cansa
as fadas protetoras dos versos aos papéis dispensados
que jamais serão esquecidos, perdidos ou desacreditados. 


Presente ao qual brindamos constantemente,
ao qual nos doamos em amor e no que mais se sente,
poesia e vida confundem-se numa só.
E eu quero mais é confundir-me com ambas, sem nenhuma dó.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Caixa de Pandora




Por: Viviane Cabrera
 
 
 
 
 
 
 
 
Não acredito mais facilmente. Foi-se a época em que a ingenuidade permitia invasões ao meu espaço. Agora, não mais. Hoje o ceticismo agudo que me arrebatou, leva a razão a desconfiar de tudo e todos. Inclusive de mim. Talvez seja paranóia. Ou talvez não.
 
Quase que num exercício metodológico, observo atentamente cada movimento alheio a analisar, passo a passo, para não ter nenhuma surpresa à frente. E não há palavras doces ou qualquer outra coisa que sirva para subornar meu bom senso. Ando sempre com um pé atrás que é para garantir.

Acho que sou como aquela caixa que Pandora levou a Prometeu. Tem muita coisa confusa e caótica que não dá para explicar. Uma dessas coisas é que por mais que tente, não consigo compreender alguns porquês existenciais. Mas, quem sabe, resida no mistério a beleza da vida. Só sei que enquanto para uns a vida é de flores, sigo com os pés nus e faço dos espinhos meu asfalto.

Irônico é que tenho fé. E muita fé. A esperança latente me faz ainda crer, lá no fundo, que o negócio é rir, mesmo. Além de exercitar a musculatura da face, coisa que de certa forma pode retardar o envelhecimento, é gostoso demais para a alma. Rir engrandece a criança que há dentro de nós.
 
 

sábado, 22 de setembro de 2012

Poema Devasso

 
 
Por: Viviane Cabrera
 
 
 
 
 
Sou dada a paixões masoquistas.
Juntar amores, colecionar conquistas.
Lançar-me ao acaso
livre e leve
sem desgosto ou descaso,
conveniência de usar o que bem me serve.
 
Ele, sem vergonha e sem juízo.
Eu, faminta pelo amor e sequiosa por chegar ao paraíso.
Juntos, são pernas e braços a se entrelaçar.
Seguem a cruzarem-se e a estrangular
a vontade de ir embora e esquecer
o que ali se passou para ir em frente e viver.
 
Ele me segura em seus braços
sufocando-me aos beijos.
Realiza meus desejos
estabelecendo nossos laços.
 
Findo flutuando na órbita universal dos amantes.
Daqueles que prestam-se a amores vagabundos e provocantes,
que incendeiam corpos, movem moinhos.
Mas que no fim das contas, ficam melhor sozinhos.





quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Morro Um Pouco

Por: Viviane Cabrera
 
 
 
Morro um pouco a cada lágrima que cai,
a cada pessoa que se vai;
com dor ou no temporal.
Praga isso de ser sentimental!

Mas tudo passa nessa vida,
cura-se o mal, fecha-se a ferida.
E num sorriso renasço,
feito mulher de aço
a galgar tudo o que me era até então alheio
e satisfazer o mais secreto anseio.

sábado, 8 de setembro de 2012

O Cigano Maldito

Por: Viviane Cabrera
 
 
 
 
 

Vem a noite com seu manto despertar memórias que deveriam ser esquecidas. Vou de um canto a outro da cama tentando achar maneira de desvencilhar dos grilhões que me ligam às lembranças. São palavras, gestos que ainda fazem meu corpo incendiar.

Todavia, ele está a um oceano de distância. Oceano das lágrimas que me fez derramar e das decepções que me afundavam ainda mais nas águas revoltas dos acontecimentos. Mas aos poucos, fui dando braçadas até chegar em terra firme e notar que de sua parte não havia nada além de deboche. Ele toca as castanholas do desdém, baila e sapateia em meus sentimentos.

Aquela voz clara e suave que acalentava tornou-se rouca e diabólica. Os braços que antes confortavam, agora estão cruzados. E minhas mãos trêmulas e vazias que hoje olho com uma interrogação em mente seguem tateando o caminho que ele destruiu.

O peito com um nó dentro dói cada vez que penso nos dias felizes. Já não existe em mim um coração, pois esse passou por tantas metamorfoses que está desfigurado. Há apenas uma estúpida esperança de que um dia eu acorde em uma manhã de outono e ouça aquela mesma voz ao ouvido, a acalmar os inúmeros anseios e inquietudes que me são característicos.

O sotaque espanhol que embalava meus ouvidos com a melodia de sua voz caminha em direção ao precipício do esquecimento, passando pelas planícies da saudade. E eu, apegada ainda à poeira deixada por seus sapatos na terra batida, sigo a observar o horizonte na expectativa de que alguma nau venha resgatar os destroços que estão espalhados.

A luz do luar desta noite trouxe uma razão plausível para aniquilar tudo o que ainda nos mantinha ligados. Foram para a fogueira alta suas fotos, cartas, presentes, junto com as memórias que a muito custo arranquei de mim. Alimentavam o fogo e davam-me a sensação de liberdade que há tempos não experimentava. Vi com satisfação aquelas coisas todas tornarem-se pó. Fiquei a madrugada toda a olhar a cena. Eram explosões contínuas de felicidade cá dentro.

Ele é maldito, dado que levou boa parte do que era só meu, das ilusões que me eram caras. Contudo, agora as brasas apagam-se definitivamente. Livre, enfim, do laço masoquista com o cigano, sigo pela estrada como cigana também. Quero experimentar aventuras que possam me devolver tudo o que perdi. Quero novos caminhos. E sem atalhos. Eu quero vida.